A conscientização sobre
a importância da defesa do organismo contra a invasão microbiana não pôde se
desenvolver até que a comunidade médica aceitasse o conceito de doenças
infecciosas. Quando infecções como a varíola e a peste se espalharam pela sociedade
antiga, embora muitos tenham morrido, várias pessoas se recuperaram. Em algumas
raras ocasiões, percebeu-se que os indivíduos curados não adoeciam em outras
epidemias – um sinal de que haviam desenvolvido imunidade. Por volta do século
XII, os chineses observaram que aqueles indivíduos que resistiram a varíola se
tornaram resistentes a posteriores exposições ao vírus. Sendo pragmáticos, os
chineses passaram a deliberadamente infectar crianças com o vírus da varíola,
inserindo crostas das feridas de pessoas infectadas em pequenos cortes feitos
na pele dessas crianças. Aquelas que sobreviviam à doença ficaram protegidas
pelo resto da vida. Em uma época em que a mortalidade infantil era elevada, os
riscos inerentes a essa prática foram aceitos. Com a evolução desta técnica,
descobriu-se que a utilização de materiais (crostas de feridas) provenientes de
infecções mais brandas minimizava os riscos. Assim, a mortalidade em função da
inoculação do vírus da varíola (“variolização”) caiu para cerca de 1%, quanto a
observada nos casos clínicos era de 20%. O conhecimento sobre a “variolização”
difundiu-se pela Europa no início do século XVIII e esta técnica passou a ser
amplamente utilizada.
Surtos
de peste bovina eram comuns por toda costa oeste da Europa desde o século IX e,
inevitavelmente, causaram a morte de muitos animais. Como não surgiram novos
medicamentos e as lesões na pele dos animais acometidos lembravam aquelas
observadas nos casos de varíola, foi sugerido, em 1754, usar a inoculação.
Neste processo, um pedaço de barbante era encharcado na secreção nasal de um
animal doente e, então, inserido em uma incisão feita na pele do animal a ser
imunizado. A doença resultante era normalmente mais branda do que a causada
pela infecção natural e o animal inoculado se tornava resistente. Esse processo
se tornou muito popular; profissionais treinados percorreram toda a Europa
inoculando os animais e mancando-os para identificar aquele que estavam
protegidos contra a peste bovina.
Em
1798, Edward Jenner, um médico inglês demonstrou que o material proveniente de
lesões da varíola bovina poderia substituir o material humano utilizado na
“variolização”. Como a varíola bovina não causa doença grave em seres humanos,
seu uso reduziu os riscos causados pela “variolação” em níveis considerados
insignificantes. A eficácia desse processo, denominado vacinação (do latim vacca, vaca) foi tão grande, que foi
utilizado na década de 1970 para erradicar a varíola no mundo.
Com
a aceitação desses princípios gerais de inoculação (embora ninguém tivesse a
menor ideia sobre como funcionavam), tentativas similares foram usadas para a
prevenção de outras doenças nos animais. Algumas dessas técnicas foram
eficazes. Assim o material derivado da varíola ovina foi utilizado para
proteger ovelhas em um processo chamado de ovinação, que foi amplamente
utilizado na Europa. Da mesma forma, a inoculação para prevenção da
pleuropneumonia bovina consistia em inserir um pequeno pedaço de tecido
pulmonar infectado dentro de uma incisão realizada na cauda. A cauda caía em
poucos dias, mas o animal se tornava imune! Embora o procedimento fosse
eficiente, o material infectado localizado na cauda também disseminava a
doença, atrasando sua erradicação. Por outro lado, a inoculação da crosta de
feridas da varíola bovina nas narinas de filhotes de cães para a prevenção da
cinomose, apesar de ter sido amplamente utilizada, foi um completo fracasso.
As
implicações das observações de Jenner acerca da varíola bovina e da importância
da menor capacidade de um organismo imunizante de causar a doença não foram
percebidas até 1879. Nesse ano, Louis Pasteur, na França, pesquisava a cólera aviária,
uma doença causada pela bactéria hoje denominada Pateurella multocida.
Pasteur possuía uma
cultura desse microrganismo que acidentalmente envelheceu na bancada do laboratório
enquanto seu assistente estava de férias. Quando o assistente voltou e tentou
infectar as galinhas com essa cultura envelhecida, as aves não ficaram doentes.
Para economizar
recursos, Pasteur não descartou essas galinhas e, então, as utilizou em um
segundo experimento, desafiando-as novamente, dessa vez com uma cultura de P. multocida fresca e sabidamente capaz
de causar a morte das aves. Para surpresa de Pasteur, as aves estavam resistentes
à infecção e não morreram. Em um admirável salto intelectual, Pasteur
imediatamente percebeu que o princípio desse fenômeno era semelhante ao
observado por Jenner ao utilizar a varíola bovina na vacinação. No processo de vacinação,
a exposição de um animal a uma cepa de um microrganismo que não causará a
doença (cepa avirulenta) pode desencadear uma resposta imune que o protegerá
contra uma posterior infecção por outra cepa do mesmo organismo ou outro
semelhante capaz de causar doença (virulenta). Após estabelecer o princípio
geral da vacinação. Pasteur primeiramente o utilizou contra o antraz. Ele desenvolveu
uma cepa avirulenta do antraz (Bacillus
anthracis) cultivando-a em altas temperaturas. Esses microrganismos
atenuados foram então utilizados como uma vacina contra a raiva, utilizando
como material de vacinação a medula espinal desidratada de coelhos infectados
com o vírus causador da doença. O processo de desidratação produziu cepas
avirulentas do vírus da raiva (e, provavelmente, eliminou a maioria dos vírus).
Embora Louis Pasteur
tenha utilizado somente organismos vivos em suas vacinas, não demorou muito até
que Daniel Salmon e Theobald Smith, nos Estados Unidos, demonstrassem que
microrganismos mortos poderiam ser usados em vacinas, Salmon e Smith provaram
que a cultura inativada pelo calor de uma bactéria denominada Salmonella choleraesuis (então
denominada Bacillus suipestifer e
possível agente causador da peste suína) era capaz de proteger pombos contra a
doença provocada por esse microrganismo. Pouco depois, na Alemanha, Von Behring
e Kitasato demonstraram que o filtrado obtido de culturas do bacilo do tétano (Clostridium tetani) era capaz de
proteger animais contra a doença, embora esse filtrado não contivesse
bactérias. Os produtos bacterianos, neste caso a toxina tetânica, também tinham
efeito protetor.
No século XX, muitas
vacinas foram criadas, e o desenvolvimento da imunidade contra doenças
infecciosas de animais já era um fenômeno bem conhecido. Desde então, os
imunologistas determinaram as bases moleculares e celulares dessa imunidade
antimicrobiana. Com estes conhecimentos surgiu a possibilidade de utilizar
mecanismos imunológicos para aumentar a resistência às doenças infecciosas. A função
do sistema imune diante de diferentes processos infecciosos tem sido elucidada.
Com isso, muito se aprendeu, mas muito ainda precisa ser pesquisado.